O verbo “transbordar” indica o que está em excesso, o que sai do espaço e se multiplica sem controle. Assim ocorre com os refugiados, os seres marinhos, as divindades e o ecossistema como um todo. Pela arte, o oceano, homenageado pela exposição, não tem limites.
A força da água ultrapassa a si mesma e interage com objetos da civilização presente nos portos e nos corpos do ar, da terra, da água e do fogo. Transbordar oceanos é tratar a década proposta pela ONU em dimensões que perpassam cada indivíduo sem pátria; a sociedade que os expulsa, ignora ou abriga; a natureza que sofre com a atuação humana e o universo em desarmonia que convive com oceanos em perigo.
Os diminutos e numerosos refugiados se perdem na imensidão do mar. Parecem ser iguais, mas ada um é distinto do outro. Não são números frios de estatísticas, mas seres humanos com naturezas internas e sociais próprias. Por trás deles, um grande espaço vazio ressalta os dilemas de uma existência sem porto de partida ou de chegada certos.
A exposição traz também seres marinhos presos em gaiolas de transportadoras. Eles buscam sair e conquistar um espaço em que estão cada vez mais oprimidos pela ação humana. Há ainda sugestões de contemplação de mares em que seus elementos constituintes são protagonistas.
Além disso, no espaço expositivo, divindades oceânicas observam tudo – e algumas delas acompanham os seres da terra e da água em sua existência. A tensão se dissemina por aqueles que são da água, mas que buscam o ar. É pela paixão do fogo do processo criativo que todos se manifestam na areia existencial que pisamos e no planeta Terra em que habitamos.
Oscar D’Ambrosio
@oscardambrosioinsta
Pós-Doutor e Doutor em Educação, Arte e História da Cultura, Mestre em Artes Visuais, jornalista, crítico de arte e curador.