Um pintor musical

Extremamente rica, variada, autêntica e, na maioria das vezes, otimista e alegre, a arte popular brasileira tem em Heitor dos Prazeres (1898-1966 uma referência obrigatória, como mostra a exposição a ele dedicada no Centro Cultural do Banco do Brasil no Rio de Janeiro, RJ.

Parceiro de Noel Rosa nos célebres versos, pela primeira vez ouvidos em 1936, “Um pierrô apaixonado, /que vivia só cantando, / por causa de uma colombina, /acabou chorando, acabou chorando”, da célebre música Pierrô apaixonado, Heitor teve um pai marceneiro que tocava na banda da Polícia Militar.

O futuro artista começou a trabalhar como polidor de móveis, estudou até a quarta série do primário e foi preso, por dois meses, aos 13 anos, por vadiagem. Trabalhou como funcionário público federal e tornou-se compositor popular de sambas, interpretados por mestres do gênero.

Sem abandonar, porém, o samba, Heitor dos Prazeres começou a pintar, como autodidata, em 1937, com o objetivo de “enfeitar as paredes”. Ganhou notoriedade ao participar da primeira Bienal Internacional de São Paulo, em 1951, sendo premiado por um júri que incluía o célebre crítico Herbert Read, um dos nomes mais respeitados da historiografia da arte mundial.

Participou ainda das Bienais paulistas de 1953 e 1961, além de realizar mostras coletivas em quase todas as capitais sul-americanas, Paris, Moscou, outras cidades europeias e no Senegal. Suas temáticas eram justamente cenas de morro, sambistas, pastoras e outras cenas tipicamente cariocas.

A principal característica pictórica de Heitor dos Prazeres é a capacidade de revelar minúcias e detalhes do universo do samba, realidade que ele retrata com extrema facilidade por conhecer muito bem. Três particularidades logo se destacam nos mais variados trabalhos do pintor: a importância que dá à figura humana, os rostos colocados de perfil, como ocorre na arte egípcia, e a forte sugestão de movimento.

Quanto a esse terceiro fator, convém salientar que homens e mulheres são geralmente retratados quase na ponta dos pés, como se dançassem ou caminhassem com velocidade. Esse fator gera imagens de grande dinamismo, em que aparecem geralmente instrumentos musicais ou pessoas com corpos contorcidos em movimentos muitas vezes sensuais.

A atmosfera dos quadros de Heitor dos Prazeres é de júbilo. Grupos de pessoas geralmente participam de uma mesma atividade em combinações de movimentos harmônicos e coordenados, dignos de um músico com nome assegurado no cancioneiro popular, mas que também tem um papel muito importante na arte popular nacional.

Arlequim, de Heitor dos Prazeres — Foto: Divulgação/CCBB Rio CCBB – Rua Primeiro de Março 66 – 1º andar – Centro – Entrada Gratuita

 

Oscar D’Ambrosio
@oscardambrosioinsta
Pós-Doutor e Doutor em Educação, Arte e História da Cultura, Mestre em Artes Visuais, jornalista, crítico de arte e curador.

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