Assim como os japoneses que estavam a bordo do navio “Kasato Maru”, primeiro do Japão a chegar ao Porto de Santos, no ano de 1908, a JCR também tem como origem a cidade de Kobe, localizada no centro da ilha do sol nascente.
A empresa nasceu em 1975 e seu primeiro trabalho foi desenvolver um método de purificação da uroquinase, uma enzima extraída da urina humana que é usada para dissolver coágulos sanguíneos e tratar doenças como a embolia pulmonar e a trombose da artéria coronária.
Focada em encontrar respostas para doenças consideradas desafiadoras pela indústria farmacêutica, a JCR se firmou como uma companhia farmacêutica especializada em produtos biofarmacêuticos, incluindo medicina celular e regenerativa. Hoje, ela possui presença internacional nos Estados Unidos e no Brasil.
No Japão, as terapias elaboradas pelo laboratório são para o tratamento de distúrbios do crescimento, doença do enxerto contra hospedeiro, anemia renal, doença de Fabry e MPS II. Já no Brasil, possui pesquisas para o tratamento da MPS II e MPS I.
A previsão para os próximos anos é expandir os estudos clínicos internacionais. Em seu pipeline, a JCR planeja implementar pesquisas sobre muitas outras doenças raras no Brasil, bem como nos Estados Unidos e na Europa.
“A JCR tem trabalhado no desenvolvimento de tecnologia proprietária e na criação de produtos, contribuindo para a saúde das pessoas por meio de produtos farmacêuticos. O início precoce dessas atividades de pesquisa, consideravelmente mais cedo do que suas empresas semelhantes japonesas, levou ao desenvolvimento de bioterapêuticos, feitos por meio de nossas tecnologias proprietárias de construção e cultura de células, o que contribuiu para o nosso reconhecimento como ‘JCR, a biofarma’”, explica Shin Ashida, presidente e CEO da JCR Pharmaceuticals.
Em 1992, teve seu IPO na Bolsa de Valores do Japão, o que abriu portas para investimentos ainda maiores e alianças internacionais com os EUA e, agora, com o Brasil. Em crescimento exponencial, a empresa faturou cerca de 30 bilhões de ienes (moeda japonesa) em vendas. Em reais, esse valor corresponde a R$ 1,2 bilhão.
JCR no Brasil
A JCR Farmacêutica iniciou as atividades no Brasil em 12 de março de 2020 . Mas só agora em 2021 , com a pesquisa em fase final e encaminhada para aprovação da Anvisa a empresa almeja novo crescimento no país.
A pesquisa clínica foi iniciada em setembro de 2018, para realizar uma pesquisa fase II para o desenvolvimento de um tratamento para Mucopolissacaridose (MPS) tipo II, doença genética que faz parte do grupo dos erros inatos do metabolismo. Esta é a primeira vez que um país latino-americano é escolhido como o primeiro na escala de projeção internacional de uma empresa farmacêutica para doenças raras.
O tratamento da JCR, já aprovado no Japão e em estudo no Brasil, é pioneiro em ultrapassar a barreira hematoencefálica, mesmo administrado por via intravenosa, para tratar a degradação neurológica que ocorre em 70% dos pacientes com MPS tipo II. Esta doença é causada pela falta de uma enzima, ocasionado o acúmulo de moléculas complexas no organismo, o que atrapalha o desenvolvimento do paciente desde seus primeiros anos e pode levar à morte antes mesmo que ele alcance a idade adulta.
As MPS são doenças hereditárias, sendo estimado que afetem 1 em cada 20 mil nascidos vivos. No Brasil, vem sendo diagnosticados 1,57 pacientes em cada 100 mil nascidos vivos (dados do período de 1994 a 2018). Ao todo, são 11 tipos da doença, cada um relacionado à falta de uma enzima específica. O tipo II, também conhecido como Síndrome de Hunter, é o mais comum no Brasil, com 493 casos registrados entre 1982 e 2019, uma média de 13 novos pacientes por ano, segundo dados da Rede MPS Brasil, programa do qual participam diversos centros de tratamento de pacientes com mucopolissacaridoses.
O tratamento atualmente disponível para MPS II não alcança o sistema nervoso central dos pacientes, tratando somente as manifestações físicas da doença. Porém, como 2/3 dos pacientes têm problemas neurológicos, novos tratamentos, como o medicamento japonês, são necessários para trazer mais qualidade de vida e mais esperança para as famílias afetadas pela forma grave da doença.
A pesquisa da JCR é liderada no Brasil pelo geneticista e professor do Departamento de Genética da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Dr. Roberto Giugliani. Além disso, o estudo também é realizado na Universidade Federal de São Paulo, com coordenação da Dra. Ana Maria Martins, geneticista, professora da Unifesp e membro da Sociedade Brasileira de Triagem Neonatal e Erros Inatos do Metabolismo (SBTEIM). Ao todo, são 19 pacientes envolvidos.
O tratamento é uma aplicação intravenosa, administrada uma vez por semana. Diferente das outras, ela conta com a tecnologia denominada J-Brain CargoⓇ, que permite que o remédio administrado no sangue atravesse a barreira hematoencefálica e penetre no sistema nervoso central, além de atuar também em todo o corpo.
Os pacientes do estudo já apresentam melhoras nos sintomas e, em alguns casos, até mesmo reversão de alguns aspectos do quadro clínico. A tecnologia desenvolvida pela JCR é um marco no avanço científico mundial.
Pai busca por tratamento e atrai farmacêutica para o Brasil
O interesse da empresa pelo Brasil surgiu após receber o contato de um pai cujo filho tem MPS tipo II com manifestações neurológicas. Obstinado em encontrar um tratamento eficaz para seu filho, Antoine Daher foi até o Japão em 2017 bater à porta da JCR em busca de ajuda. Na época, seu filho tinha 8 anos de idade e se aproximava da adolescência, momento em que muitas crianças com MPS morrem em virtude de complicações da doença.
A criança possui manifestações da doença no cérebro e, por isso, Antoine percebia que, com o tratamento já existente no Brasil, a parte física de seu filho melhorava, mas a degeneração neurológica continuava.
“Eu sempre fui em busca de novidades terapêuticas no mundo inteiro e então descobri a JCR, que tem uma enzima que penetra a barreira hematoencefálica, o que os tratamentos existentes não conseguem fazer. Entrei em contato com a Farmacêutica e recebi o convite para conhecer a fábrica no Japão, acompanhado do professor e médico geneticista Dr. Roberto Giugliani, reconhecido mundialmente”, explica Antoine.
A CEO da JCR Farmacêutica no Brasil, Vanessa Tubel, explica que, em um primeiro momento, a pesquisa não seria realizada no Brasil, e sim no Japão e nos Estados Unidos, um dos primeiros destinos internacionais naturalmente escolhidos por indústrias farmacêuticas. Porém, durante a reunião com Antoine, tudo mudou.
Na ocasião, Antoine Daher e Dr. Roberto Giugliani falaram aos executivos sobre o grande número de pacientes com Síndrome de Hunter no Brasil, das necessidades médicas não atendidas e apresentaram propostas de colaboração entre diferentes stakeholders, fazendo com que a JCR decidisse trazer seus medicamentos inovadores a mais pacientes e famílias brasileiras.
“A JCR mudou então todo o planejamento de pesquisa. A ida ao Japão aconteceu em julho de 2017 e a pesquisa começou no Brasil em setembro de 2018. Pela primeira vez na história, uma farmacêutica japonesa trouxe uma pesquisa de Fase 2 para o Brasil, antes de levar para os EUA ou para Europa. Com a pesquisa avançando com o filho de Antoine e com os outros 18 pacientes brasileiros, o Brasil pode se tornar uma referência no estudo clínico de doenças raras”, explica Vanessa Tubel.
Fonte: Agência Fato Relevante