Flávia Villela – Repórter da Agência Brasil
Uma em cada três mulheres grávidas em presídios do país foram obrigadas a usar algemas na internação para o parto e mais da metade teve menos consultas de pré-natal do que o recomendado. Os dados fazem parte de um estudo da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) sobre o perfil da população feminina encarcerada que vive com os filhos em unidades prisionais femininas no país.
O acesso à assistência pré-natal foi inadequado para 36% das mães. Durante o período de hospitalização, 15% afirmaram ter sofrido algum tipo de violência, seja ela verbal, psicológica ou física. Ainda segundo a pesquisa, 32% das grávidas presas não fizeram teste de sífilis e 4,6% das crianças nasceram com sífilis congênita.
De acordo com uma das coordenadoras da pesquisa e integrante da Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz, Maria do Carmo Leal, as condições da atenção à gestação e ao parto para a mães encarceradas no Sistema Único de Saúde são piores que as dadas às mães não encarceradas. “O estudo mostrou também que havia diferença na avaliação da atenção recebida durante a internação para o parto segundo a condição social delas. Foi menor a satisfação para as pobres e as de cor de pele preta ou parda”.
A pesquisa deu origem ao documentário Nascer nas prisões, dirigido por Bia Fioretti, que ainda será lançado pela Fiocruz. No filme, mães encarceradas contam que seu maior medo é que os bebês sejam mandados para um abrigo, já que na maioria dos presídios a criança só pode permanecer até completar 1 ano.
Na maioria dos estados brasileiros, a mulher grávida é transferida, no terceiro trimestre de gestação, da prisão de origem para unidades prisionais que abriguem mães com filhos, geralmente localizadas nas capitais e regiões metropolitanas. O parto é feito em hospital público e elas retornam para a unidade prisional com o recém-nascido. Após o sexto mês, geralmente as crianças são entregues aos familiares. Na ausência destes, vão para abrigos e a mãe retorna à prisão de origem.
Foram ouvidas 241 mães, sendo que 45% delas têm menos de 25 anos, 57% são de cor parda e 53% têm menos de oito anos de estudo.
Mães encarceradas
A pesquisa revela que 83% das presas têm pelo menos um filho e 31% delas são chefes de família. A população carcerária feminina cresceu 118% entre 2005 e 2014 no Brasil, segundo dados do Ministério da Justiça.
No Brasil, os principais motivos que levam as mulheres à prisão são crimes relacionados ao tráfico de drogas (68%) e contra o patrimônio (9%), como estelionato e roubo. Somente 7% das presas haviam cometido homicídio ou latrocínio.
Impactos sociais
A advogada Luciana Dimas avalia que os impactos do afastamento dos filhos em relação à mãe encarcerada são nocivos não apenas para as crianças, mas também para a sociedade como um todo. “É extremamente injusta essa consequência produzida para os filhos dessas mulheres, não apenas os que estão na prisão, como também os que estão fora da prisão, que são excluídos, estão em processo de extrema vulnerabilidade social”, diz.
Uma das soluções para resolver esse problema seria soltar as presas provisórias com filhos, já que a maior parte delas cometeu crimes considerados de baixa periculosidade. É o que defende a assistente social Marilene da Silva João, que trabalha com esse público. “A maioria delas são presas provisórias e muitas vezes acabam indo embora, então por que não soltá-las? O Estado sai ganhando, a sociedade sai ganhando”, opinou.
Ainda que não sejam soltas, é necessário que a sociedade repense o que fazer em relação às mães presas, de modo a humanizar as relações, na opinião da dentista Aline Cabral, que integra o Núcleo de Saúde da Secretaria da Justiça e Cidadania do Ceará. “A população em geral prefere que o preso morra, fique apodrecendo na cadeia, mas esquece que o preso só está passando um tempo ali. Daqui a pouco vai estar em liberdade e resta a nós escolher se queremos que ele volte melhor ou pior”, afirmou Aline.
Edição: Lidia Neves