O presidente Luiz Inácio Lula da Silva abriu a 78ª Assembleia Geral das Nações Unidas, na manhã desta terça, 19/9, em Nova York, com um discurso no qual reafirmou a necessidade de uma união global contra a desigualdade e a fome, a adoção de medidas urgentes contra mudanças climáticas e a reforma de instituições de governança global.
Na oitava vez em que abriu o principal evento anual da ONU como presidente do Brasil – com ausência apenas em 2010 –, Lula relembrou de seu primeiro discurso, proferido há duas décadas, na 58ª Assembleia Geral. “Há vinte anos, ocupei esta tribuna pela primeira vez. E disse, naquele 23 de setembro de 2003: ‘Que minhas primeiras palavras diante deste Parlamento Mundial sejam de confiança na capacidade humana de vencer desafios e evoluir para formas superiores de convivência’. Volto hoje para dizer que mantenho minha inabalável confiança na humanidade”, afirmou.
Para Lula, as mudanças climáticas se tornaram uma das principais ameaças contra a humanidade nas últimas duas décadas, especialmente para as populações mais vulneráveis. “Naquela época, o mundo ainda não havia se dado conta da gravidade da crise climática. Hoje, ela bate às nossas portas, destrói nossas casas, nossas cidades, nossos países, mata e impõe perdas e sofrimentos, sobretudo aos mais pobres”.
Esse problema ajuda a ampliar as sequelas que a desigualdade traz para o planeta, segundo Lula. Apesar da produção de alimentos ter se modernizado, uma parcela significativa da humanidade continua sofrendo com a insegurança alimentar.
“A fome, tema central da minha fala 20 anos atrás, atinge hoje 735 milhões de seres humanos, que vão dormir esta noite sem saber se terão o que comer amanhã. O mundo está cada vez mais desigual. Os 10 maiores bilionários possuem mais riqueza que os 40% mais pobres da humanidade”, criticou. “É preciso antes de tudo vencer a resignação, que nos faz aceitar tamanha injustiça como fenômeno natural”.
Na ONU, o presidente reafirmou as três prioridades que vão nortear a Presidência brasileira do G20, que começa em 1º de dezembro de 2023: o combate à fome, pobreza e desigualdade; a transição energética e o desenvolvimento sustentável em suas três dimensões (econômica, social e ambiental) e a reforma do sistema de governança internacional.
MUNDO DESIGUAL – No discurso, o presidente Lula destacou que a desigualdade cria ou amplia a maior parte das crises que o mundo enfrenta na atualidade. Isso exige dos governos mundiais uma atuação firme, para não só para conter as graves consequências, mas para poder atingir as raízes dos problemas.
“A comunidade internacional está mergulhada em um turbilhão de crises múltiplas e simultâneas: a pandemia da Covid-19, a crise climática e a insegurança alimentar e energética ampliadas por crescentes tensões geopolíticas. O racismo, a intolerância e a xenofobia se alastraram, incentivadas por novas tecnologias criadas supostamente para nos aproximar”, disse.
Criada pela ONU para determinar objetivos de desenvolvimento sustentável para o planeta, a Agenda 2030 seria o principal instrumento para aliviar essas pressões, mas, para o presidente, os objetivos para o fim da década dificilmente serão cumpridos.
“O imperativo moral e político de erradicar a pobreza e acabar com a fome parece estar anestesiado. Nesses sete anos que nos restam, a redução das desigualdades dentro dos países e entre eles deveria se tornar o objetivo-síntese da Agenda 2030”, declarou ele.
MUDANÇA CLIMÁTICA – Lula também destacou que as mudanças no clima precisam ser enfrentadas coletivamente, mas que os países industrializados precisam cumprir com sua responsabilidade histórica e material.
“Os países ricos cresceram baseados em um modelo com altas taxas de emissões de gases danosos ao clima. A emergência climática torna urgente uma correção de rumos e a implementação do que já foi acordado. Não é por outra razão que falamos em responsabilidades comuns, mas diferenciadas. São as populações vulneráveis do Sul Global as mais afetadas pelas perdas e danos causados pela mudança do clima. Os 10% mais ricos da população mundial são responsáveis por quase a metade de todo o carbono lançado na atmosfera. Nós, países em desenvolvimento, não queremos repetir esse modelo”, disse o presidente.
Ele também criticou os países ricos por não cumprirem acordos climáticos. “A promessa de destinar US$ 100 bilhões anualmente para os países em desenvolvimento permanece apenas isso, uma promessa. Hoje esse valor seria insuficiente para uma demanda que já chega à casa dos trilhões de dólares”.
A transição energética ocupa um lugar importante, por possibilitar que formas de geração não renováveis e geradoras de poluição possam ser substituídas por fontes renováveis. Como vem fazendo ao longo do ano nos eventos internacionais, Lula destacou que o Brasil é um exemplo mundial na produção de energia limpa.
“No Brasil, já provamos uma vez e vamos provar de novo que um modelo socialmente justo e ambientalmente sustentável é possível. Estamos na vanguarda da transição energética, e nossa matriz já é uma das mais limpas do mundo. 87% da nossa energia elétrica provem de fontes limpas e renováveis. A geração de energia solar, eólica, biomassa, etanol e biodiesel cresce a cada ano. É enorme o potencial de produção de hidrogênio verde. Com o Plano de Transformação Ecológica, apostaremos na industrialização e infraestrutura sustentáveis”, ressaltou.
AMAZÔNIA POR SI – Ainda na questão climática e ambiental, o presidente citou a iniciativa de reunir, no mês passado, representantes de todos os países amazônicos na Cúpula da Amazônia, numa perspectiva de buscar um alinhamento e de criar uma nova agenda de colaboração entre os países que fazem parte daquele bioma.
“Retomamos uma robusta e renovada agenda amazônica, com ações de fiscalização e combate a crimes ambientais. Ao longo dos últimos oito meses, o desmatamento na Amazônia brasileira já foi reduzido em 48%. O mundo inteiro sempre falou da Amazônia. Agora, a Amazônia está falando por si. Sediamos há um mês a Cúpula de Belém, no coração da Amazônia, e lançamos nova agenda de colaboração entre os países que fazem parte daquele bioma. Somos 50 milhões de sul-americanos amazônidas, cujo futuro depende da ação decisiva e coordenada dos países que detêm soberania sobre os territórios da região”, disse o presidente.
GOVERNANÇA GLOBAL – Em última instância, a desigualdade é reproduzida também nas instituições internacionais. Mais uma vez, o presidente Lula pediu por uma reforma nessas entidades multilaterais, para que seu funcionamento não sirva apenas para a manutenção dos privilégios dos países desenvolvidos.
“O princípio sobre o qual se assenta o multilateralismo – o da igualdade soberana entre as nações – vem sendo corroído. Nas principais instâncias da governança global, negociações em que todos os países têm voz e voto perderam fôlego. Quando as instituições reproduzem as desigualdades, elas fazem parte do problema, e não da solução. No ano passado, o FMI disponibilizou US$ 160 bilhões em direitos especiais de saque para países europeus, e apenas US$ 34 bilhões para países africanos. A representação desigual e distorcida na direção do FMI e do Banco Mundial é inaceitável”, criticou o presidente.
Dentro da ONU, um organismo que precisa ser revisto, na visão do presidente Lula, é o Conselho de Segurança, que tem sua atuação limitada e não consegue interferir diante dos conflitos causados pelos seus próprios membros permanentes, como vem acontecendo nos últimos anos.
“O Conselho de Segurança da ONU vem perdendo progressivamente sua credibilidade. Essa fragilidade decorre em particular da ação de seus membros permanentes, que travam guerras não autorizadas em busca de expansão territorial ou de mudança de regime. Sua paralisia é a prova mais eloquente da necessidade e urgência de reformá-lo, conferindo-lhe maior representatividade e eficácia”, ressaltou Lula. “A ONU precisa cumprir seu papel de construtora de um mundo mais justo, solidário e fraterno”.
Fonte: Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República